A FICÇÃO DO ABORTO LEGAL NO BRASIL E A ATUAÇÃO DO JUDICIÁRIO: como um grave problema de saúde pública pode ser acentuado ainda mais em tempos de governos autoritários e a importância do acesso à justiça para a amenização desse cenário
DOI:
https://doi.org/10.18764/2236-4358v12n35.2022.13Palavras-chave:
violência, aborto, saúde pública, autoritarismoResumo
A violência que circunda o tema do aborto no Brasil pode ser entendida tanto a partir da sua criminalização, quanto a partir das barreiras impostas às mulheres que estão no seu direito legal de realizar o procedimento, contudo não encontram a garantia desse direito quando precisam. Uma vez que em uma sociedade patriarcal o que se procura são formas de castigar os corpos femininos, debater o aborto como o problema de saúde pública que ele é se constitui num caminho bastante tortuoso, o qual perpassa pelo estigma envolvendo o tema, o que afeta inclusive os serviços de abortamento legais, escassos e difíceis de serem acessados. O problema que se propõe consiste no seguinte questionamento: a vigência de um governo autoritário, reflexo do seu povo que o investiu de poder, tem a capacidade de, direta ou indiretamente, cercear ainda mais o direito ao aborto legal? Desse modo, pretende-se, por meio do método hipotético-dedutivo, demonstrar de quais formas e por meio de quais figuras estatais os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres são constantemente sonegados e ainda podem ser retrocedidos em tempos de autoritarismo, embora a judicialização possa vir a ser um caminho para a atenuação do problema. A conclusão a que se chega é que a ascensão de governos conservadores representa também a ascensão da violência de gênero, inclusive aquela praticada contra a mulher que encontra dificuldades para o exercício de um direito há muito tempo previsto, porém ainda não efetivamente garantido: o aborto legal de forma gratuita e segura.
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