Rousseau e a épica das confissões, de Susanne Bernard à Penélope: mito heroico da herança de um coração sensível

Autores

  • Luciano da Silva Façanha Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Palavras-chave:

Rousseau, Homero, Epopeia, Confissões, Penélope, Odisseia

Resumo

Há nas Confissões, muitos elementos que corroboram com traços da epopeia, inclusive a marcante presença da figura feminina da virtuosa Penélope em sua autobiografia e em seu romance. Claro, com outros elementos, apresentando o modelo de contar sobre si mesmo. Colocando alguns conflitos do mundo homérico com seu próprio estilo de vida, sendo evidenciado nos traços semelhantes que Rousseau traz para suas memórias. Mesmo não utilizando de argumentos, mas percebemos uma narrativa com enredo, ação, personagens e sentimentos, pois há uma tentativa de alinhar seu romance pessoal com a doutrina clássica, mas sem apoio de um paralelo literário existente, portanto, uma tentativa moderna e original de apresentar um novo estilo. Dessa forma, pretende-se apresentar alguns momentos importantes das Confissões em que o autor remete à epopeia de Homero, por meio de Penélope, principalmente, ao remontar a gênese e a estrutura de seu romance filosófico, Júlia ou A Nova Heloísa, mas também, alguns momentos em que o autor se reporta a Odisseia na própria Nova Heloísa, ao contar sobre a virtuosidade de Júlia em comparação a ilustres personagens femininas da tradição ocidental, como Penélope, e no Emílio, ao se reportar ao canto das Sereias. Embora sejam somente sugestões, pois em nenhum momento Jean-Jacques informa essa intenção e nem esboça uma teoria sobre isso, nem aplica diretamente a fórmula da epopeia. É bem verdade que as diferenças aparecem mais do que as semelhanças, no entanto, o autor se utiliza de momentos clássicos dos acontecimentos da Odisseia, adaptando e rememorando esses acontecimentos a seu propósito a partir de alguns aspectos de sua “trama épica”, utilizando o estilo e cenas da epopeia numa fórmula moderna como a de uma autobiografia, em que percebe como um grande filão da modernidade. Talvez, apenas um escritor que pretendia utilizar algumas características épicas como uma base real para um novo gênero que estava sendo criado, revelando o quão longe estava do mundo épico que tanto admirava. E, como no século XVIII o romance era um gênero malvisto, provavelmente Rousseau observou na autobiografia uma possibilidade e resolveu evocar, em alguns momentos o prestígio da epopeia, pois isso ajudaria a conquistar leitores para sua primeira tentativa confessional desse gênero, um interesse menos preconceituoso por parte dos homens de letras. Uma tentativa de colocar esse tipo de obra sob o disfarce de um membro antigo e venerado, como a epopeia.

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Biografia do Autor

Luciano da Silva Façanha, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Doutor em Filosofia, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC-SP

Referências

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Publicado

2025-12-08

Como Citar

da Silva Façanha, . L. (2025). Rousseau e a épica das confissões, de Susanne Bernard à Penélope: mito heroico da herança de um coração sensível. Revista Interdisciplinar Em Cultura E Sociedade, 37–52. Recuperado de https://periodicoseletronicos.ufma.br/index.php/ricultsociedade/article/view/28286

Edição

Seção

Dossiê Temático "Rousseau, Kant & Diálogos - Seção Gênero"