Rousseau e o mito de Glauco: Uma reflexão em torno da ética da informação

Abstract

O escopo deste texto é pensar a ética e a responsabilidade na disseminação de dados informacionais à luz do pensamento de Jean-Jacques Rousseau com base em uma hermenêutica sobre a passagem da alegoria platônica da estátua de Glauco tal como aparece no Discours sur l'origine et les fondements de l'inégalité parmi les hommes. No exame dessa passagem, que remonta ao mito do Glauco marinho referido nos diálogos A República e As Leis, de Platão, além de textos extraídos do livro Metamorfoses, de Ovídio, delineia-se um conceito de ética da informação que reafirma a inseparabilidade — sugerida pela máxima heraclitiana ethos anthropou daimon — entre a forma ética e a ação política, destacando a existência de uma ponte que liga, de um lado, a noção de daimon enquanto ação identificada a uma finalidade eudaimônica, tal como a concebe Aristóteles na Ética a Nicômaco e, de outro, a noção de ethos enquanto noção identificada ao caráter deontológico, tal como o concebe Kant na Crítica da Razão Prática. Trata-se de uma perspectiva na qual o maravilhamento que se faz acompanhar das nuances da magia metamorfoseante operadas pela feiticeira Circe no interior da narrativa mítica representa o passo filosófico do thaumadzein em direção a uma ética do reconhecimento fundamentada no reconhecimento de que o indivíduo humano, mesmo no seio da mais corrupta sociedade, permanece essencialmente bom e livre para ativar o poder mágico da transformação que o torna aparentado ao divino. A relevância prática e contemporânea dessa reflexão se mostra em face do fenômeno da desinformação viabilizada pela disseminação antiética dos dados informacionais, em que o conceito de sociedade da informação, enquanto harmonia entre a forma do ethos da contemplação filosófica e a ação do daimon político, permanece sendo um desafio à inteligência voltada ao problema da responsabilidade ética na atualidade.